“Reabertura da ponte de South Fork depois da inundação de novembro de 1940. 1941 (?) – Ponte South Fork, Gold Bridge, B.C., Canadá”
É a descrição para a fotografia exibida na seção online de histórias do Museu Bralorne Pioneer de British Columbia, Canadá. A imagem pode ser vista especificamente nesta página (role até a metade), em meio a outros itens que seriam do acervo da exposição virtual. Notou algo diferente?
O homem que parece usar óculos escuros modernosos ainda se veste de maneira despojada – para os padrões bem atuais – e segura uma câmera fotográfica portátil.
A conclusão não poderia ser outra: seria um viajante do tempo capturado em 1940!
Se a história que lembra o enredo de um filme já parece fantástica, o detalhe mais engraçado que encontrei ao me deparar com mais esta lenda que nasce pela rede foi a resposta a um comentário cético – ou cínico – sobre como parece duvidoso que um viajante do tempo resolva visitar a reabertura de uma ponte nos confins do Canadá em 1940 ao invés de algo um pouco mais interessante historicamente, como a crucificação de Jesus ou o nascimento de Hitler.
Ao que veio a resposta: “Claro, porque até onde sabemos nada de importante aconteceu naquele local, naquela data, certo? Quem garante que em outra linha temporal algo extraordinário não deveria ter ocorrido?”.
Realmente, quem garante? Mas antes de mergulhar de cabeça em fabulosos roteiros de Hollywood, voltemos um pouco à realidade. A fotografia realmente mostra um viajante do tempo?
A fonte
Como já comentamos, a imagem está disponível no sítio online oficial dos museus do Canadá. Seria parte da exibição “Their Past Lives Here”, que teria sido exposta pelo menos desde o ano de 2004. Parece estar online desde fevereiro deste ano, possivelmente antes. A imagem com o “viajante do tempo” só foi notada como tal no final de março, quando foi indicada em alguns dos principais sítios onde este tipo de história pode ser disseminada: o fórum Above Top Secret, o agregador FARK e outros.
A princípio, dada a fonte, confiaríamos que seria uma fotografia autêntica, tomada pouco depois de 1940. Uma Error Level Analysis sugere que a imagem não foi manipulada digitalmente, ou pelo menos que, se foi, o manipulador foi perspicaz o suficiente para normalizar o erro por toda a imagem.
Como explicar o “viajante do tempo”?
Nem tão fora de lugar
Como alguns membros do fórum ATS, como “Outkast Searcher”, notaram, apesar de parecerem muito modernas as roupas e mesmo os óculos vestidos pelo sujeito podiam ser encontrados na década de 1940. Abaixo vemos óculos similares usados pela atriz Barbara Stanwyck no filme “Double Indemnity” (1944):
Já as roupas também podem ser encontradas na época. Acostumados como estamos à moda atual, presumimos que o homem veste uma camiseta com uma estampa, algo um tanto anacrônico. Note contudo que ele poderia bem estar usando, e em verdade tudo indica que estava usando ao invés uma blusa. E blusas com insígnias bordadas não eram tão raras:
O casaco poderia ser um casaco crochetado à mão com botões à frente. Algo que sem dúvida já existia na década de 1940.
Finalmente, apesar de alguns comentários sobre a câmera também ser anacrônica, o fato é que não é possível ver bem seus detalhes. Sem dúvida é uma câmera antiga. Já se encontraram câmeras de poucos anos depois muito similares, e é mais do que plausível que se encontre um modelo idêntico disponível no início da década de 1940.
Isto é: ainda que esta foto seja autêntica, que retrate fielmente uma cena, um homem e seus curiosos óculos e roupas há 70 anos atrás, não deve ser por si só a prova que tantos gostariam de um viajante do tempo.
Nem tão novo
Apesar de ser uma nova história sensacional a partir de uma fotografia disponível em museu online canadense, histórias e mesmo imagens de supostos viajantes do tempo não são novidade. A lenda mais circulada na rede é a de Andrew Carlssin, o viajante do tempo do século 23 que apareceu subitamente em Wall Street no ano de 2003. Aos que levem a história a sério, é preciso informar que foi inventada pelo tablóide Weekly World News, conhecido por histórias absurdas como a pílula para eliminar flatulência, e que explorou toda a saga com bom humor.
Também há a história de John Titor, um enredo elaborado envolvendo um viajante do tempo participando em fóruns de discussão pela rede! Apesar do que algumas páginas na rede lhe dirão, é preciso informar que quase todas as previsões que “Titor” fez sobre o futuro de onde veio mostraram-se incorretas. Incluindo a criação de mini-buracos negros em 2001 e uma guerra civil que se iniciaria em 2004 nos EUA, eventos que fariam com que não fossem mais realizados jogos olímpicos depois dessa data. Nada disso se concretizou.
Há alguns anos também circulou, se bem me lembro, a fotografia de um sujeito com um corte de cabelo em estilo “Moicano” frequentando um festival, anos antes que tal estilo se tornasse comum com o movimento punk. Infelizmente não pude encontrar referência a este episódio (teria sido apagado pelos viajantes do tempo?), mas pelo que me lembro os comentários já haviam notado que embora incomum, o corte de cabelo “moicano” não era tão raro assim mesmo antes de se popularizar. Precede mesmo a tribo Moicana.
Tudo lenda, tudo ficção, tudo engano.
Fim de assunto?
Por certo que não! Apesar de tudo sugerir que a imagem seja autêntica e retrate um homem um tanto deslocado, mas não no tempo, é possível que seja sim uma manipulação digital. Afinal, inserir figuras modernas em imagens antigas não é nada difícil. Uma série que fez sucesso recentemente coloca super-heróis modernos em fotos históricas:
É possível que uma fraude elaborada inserisse uma fotografia manipulada entre o acervo de um pequeno museu canadense? Bem, é possível.
Olhemos de novo a fotografia. Preste atenção no braço direito do “viajante” segurando a câmera: uma olhada mais atenta sugere que o braço direito pertence em verdade ao homem de terno atrás dele. Por que o braço de outro homem estaria nesta posição? Há mesmo espaço para o “viajante do tempo”, que já parece muito alto, ficar de pé nessa imagem?
Ou seria apenas uma perspectiva incomum, sendo que o braço do homem ao fundo apenas parece estar sobre nosso “viajante do tempo”, chegando mesmo a tocar a máquina fotográfica? Ou seria mesmo o braço do “viajante do tempo”, apenas em uma posição diferente?
Se esta é uma manipulação digital, por que seu autor inseriria um homem com trajes que embora incomuns, sim poderiam ser encontrados na década de 1940? Por que colocar em suas mãos uma máquina fotográfica que parece à primeira vista apenas alguns anos fora de época? Por que não inserir o logotipo de uma empresa criada décadas depois, como NIKE?
Muitas perguntas, para a resposta de que este que escreve aqui simplesmente não sabe se a fotografia é ou não autêntica. É preciso deixar claro que, com certeza, e até onde sabemos, não é algo como uma prova da viagem no tempo. Afinal, repetindo, tudo que o homem veste poderia ser encontrado em 1940. Mas realmente não posso dizer se ou por que poderia ser forjada. Presumo que seja autêntica e que o braço deslocado seja apenas uma perspectiva incomum, porém preciso admitir minha incerteza.
Fonte : Ceticismo Aberto
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